28 de fev. de 2012

Edgar Fagundes



Prezados amigos,

estamos precisando do contato de Edgar Fagundes. Por favor, o amigo que tiver o e-mail ou telefone do gaiteiro, entre em contato conosco.

27 de fev. de 2012

Eugênio de Assis e sua sanfona Pé de Bode - Passo Largo

A sanfona de oito baixos na região Centro-Oeste parece ter sido ofuscada. No entanto, aos poucos, sobretudo através da Internet, surgem alguns lampejos sobre a prática deste instrumento nesta região. É o caso de Eugênio de Assis. Infelizmente, não disponho de nenhuma informação biográfica sobre este sanfoneiro, senão o fato dele ser o pai de dois integrantes da dupla caipira "Os filhos de Goiás, que exerceu certa influência na década de 1970.
"Passo Largo" com Eugênio de Assis e sua sanfona Pé de Bode, é um interessante demonstrativo da sanfona do Brasil Central. No disco, o predomínio das linhas marcadas pelo baixo acentua os caminhos da música sertaneja, revelando forte influência do country norte-americano. O uso de terças paralelas e melodias bem delineadas são característica da música caipira.


Provavelmente, a sanfona utilizada por Eugênio de Assis é o instrumento que aparece na contracapa do disco, uma Todeschini azulada na afinação natural, combinação de tonalidades de sol e dó. Curiosamente, aprendi as primeiras lições num instrumento idêntico a este.
Aqueles que porventura, tenham alguma informação a respeito de Eugênio de Assis, por favor, entrem em contato conosco. Juntos poderemos ajudar a encontrar mais um pedaço deste quebra-cabeça que é a história da sanfona de oito baixos no Brasil.




11 - Rancheira do povo (Eugênio de Assis)

25 de fev. de 2012

“MANÉ SIBITO”| Caldeirão Político

“MANÉ SIBITO”| Caldeirão Político


“MANÉ SIBITO”
Postada em: Sexta, 24 de Fevereiro de 2012 às 10h50 | Posts 2113
“MANÉ SIBITO”


Escreveu: Francisco Alves Cardoso - 24/02/2012
Analisando o título, parece mais um histórico de menosprezo: “Mané”, uma palavra muito usada como tratamento desagradável a pessoa, e “Sibito” um dos pássaros menores do universo da fauna.



Nada disso, estamos falando de um valor histórico, um mito da cultura sertaneja paraibana, até hoje esquecido pelos conterrâneos e pelos que administram os nossos movimentos culturais, de um modo geral.


“Mané Sibito” era uma das figuras mais conhecidas em Sousa, até bem pouco tempo. O homem do famoso fole de oito baixos, que desfilava pelas ruas da cidade animando os festejos, especialmente no período carnavalesco. Ninguém podia imaginar os carnavais na Cidade Sorriso sem a presença de “Seu Mané”, um homem de pequena estatura, simples, humilde, pobre, no entanto muito respeitado por todos. Na sua casa desprovida, trabalhava consertando fole e outros afazeres domésticos. Não sabia dizer “não” e nem menosprezar qualquer ser humano que lhe procurasse.


Levou toda uma vida de simplicidade e de respeito ao semelhante. A única vaidade que tinha com força era executar músicas no seu fole tão estimado pelos sousenses.


Mas, o brasileiro tem mania de esquecer os seus valores culturais. Morreu “Mané Sibito”, morreu a sua história. Ninguém relembra o seu passado de alegria, a sua passagem pela terra de tantas culturas, de tantas glórias.


Já bem velhinho, ainda desfilava num carro sem capota, principalmente no período momesco, tocando pelas ruas de Sousa, parando em alguns lugares para alegrar os foliões. Esse era o seu desejo: “tocar, animar, alegrar os amigos”.


A direção do Festival de Músicas Gonzagueanas - FESMUZA, promovido pelo “Caldeirão Político” e Grupo União São Francisco vai prestar significativa homenagem a “Mané Sibito”, por ocasião do evento, em agosto próximo, dentro das comemorações dos cem anos de nascimento de Luiz Gonzaga, o “Rei do Baião”.


O V FESMUZA será realizado nos dias 16, 17 e 18 de agosto do corrente ano de 2012, na Fazenda Cidade, município de São João do Rio do Peixe, e uma das finalidades principais é enaltecer a cultura através de nomes famosos da música, das artes cênicas, poesia, folclore e artistas que brilharam nos sertões paraibanos e que não podem ser esquecidos. Foi criado em primeiro lugar, para reverenciar a memória do Gonzagão, e rebuscar os seus seguidores que fazem parte de uma história de valorização do nosso eixo cultural.


A Comissão Organizadora já iniciou a busca de dados do legendário “Mané Sibito”, junto a pessoas que conheceram a sua luta, como também fotografias e depoimentos que vão servir para a formação da história desse menestrel que cantou e encantou décadas na região da Grande Sousa.

24 de fev. de 2012

Mangabinha - Pé de Bode vol.6





Carlos Alberto Mangabinha Ribeiro nasceu em Corinto, Minas Gerais, no ano de 1942.
Aprendeu a tocar sanfona de oito baixos às escondidas, sem que o seu pai soubesse. 
Embora tenha se tornado mais conhecido como  integrante do famoso trio Parada Dura, Mangabinha gravou diversos discos na sanfona "pé-de-bode", como  os mineiros gostam de chamar a sanfona de oito baixos.
É um dos poucos sanfoneiros do estado de Minas Gerais a gravar discos fonográficos como solista deste instrumento, apresentando o estilo calangueado. Em seu repertório, calangos, rancheiras, polcas, limpa-bancos e xotes se entretescem através de um estilo delineado por terças paralelas e consecutivas e linhas melódicas de indiscutível sabor sertanejo.
"Pé de bode vol.6" foi editado pela gravadora Copacabana em 1979. Infelizmente, como de praxe, os músicos do excelente regional de acompanhamento não foram creditados na contracapa.
A instrumentação é leve, composta por baixo elétrico, violão de sete cordas e violão rítmico, responsável pelos recortes das danças. Aliás, é uma instrumentação bem interessante e característica. 
Nesta gravação, Mangabinha utiliza basicamente uma sanfona Hering em afinação natural na combinação de tonalidades de sol e dó.
Ao contrário das regiões Sul e Nordeste, a sanfona de oito baixos anda esquecida no sudeste. Com ela, seus representantes, muitos dos quais, como o próprio Mangabinha, se tornaram solistas de acordeom de cento e vinte baixos, para manter em atividade suas carreiras profissionais.









Unidos da Tijuca vitoriosa

Nossas congratulações a toda equipe da Unidos da Tijuca que empreendeu um belíssimo desfile e a consequente vitória. Sem esquecer de que na revista anual da Unidos da Tijuca, há um texto de nossa lavra intitulado: "Dos 8 aos 120 baixos, de Januário a Gonzaga, algumas impressões sobre a sanfona na região Nordeste. http://sanfonade8baixos.blogspot.com/2012/02/luiz-gonzaga-o-rei-do-sertao-samba.html

23 de fev. de 2012

Leo Rugero - Calango



Neste vídeo, interpreto na sanfona de oito baixos um trecho do "Calango do ponto liso", parceria com o saudoso sanfoneiro petropolitano João Torquato, inspirado em motivo tradicional de calango.

21 de fev. de 2012

A dança do chimite



Enviado por Sinvaline em 30/10/2007

"Chimite é uma dança ainda pouco conhecida no Brasil , na cidade de Uruaçu o grupo de Folclore Serra da Mesa dança e divulga essa manifestação, sob a coordenação de Sinvaline Pinheiro. É um ritmo contagiante".

Chimite



Enviado por leorugero em 20/02/2012

Encontrei este video na Internet. Se trata de um exemplo do "Chimite", dança de possível origem nordestina. Porém, foi na região Centro - Oeste que o ritmo se propagou, tornando-se representativo sobretudo no estado de Goiás.
A sanfona de oito baixos é o instrumento principal, sendo acompanhada por pandeiro ou zabumba e, eventualmente, viola e violão.
Mais detalhes sobre esta prática musical no pequeno artigo escrito por Sinvaline no blog Overmundo.
http://www.overmundo.com.br/overblog/chimite

16 de fev. de 2012

XOTES - ESTAMPA DA VOVÓ FRANCISCA C/ Thaisinha.

Correia dos Oito Baixos

Hoje, 16 de fevereiro, é aniversário do sanfoneiro sergipano Carlos Correia Matos, o Correia dos Oito Baixos. Nascido no município de Capela, em 1953, Correia aprendeu a tocar sanfona em um instrumento de 4 baixos e uma carreira de botões para a mão direita.Seu filho, Antônio Correia Matos, observa que a experiência neste instrumento, fez com que seu pai desenvolvesse "a mecânica de tocar em um terno só". 
Posteriormente, Correia viria adquirir uma sanfona de oito baixos. Como descreve Antônio, "ele comprou uma Todeschini há cerca de 36 anos, de uma família que adquirira um instrumento para a filha aprender, eis que naquela época era comum o aprendizado de instrumentos como piano e acordeon por parte do filhos, no caso das famílias com melhores condições financeiras. Ocorre que, ao invés de comprarem um acordeon piano, compraram um oito baixos. Ou seja, a sanfona nem chegou a ser usada, e meu pai teve a sorte de comprá-la ainda novinha." O instrumento adquirido por Correia era uma sanfona Todeschini avermelhada na afinação natural em sol/dó. Porém, aos poucos "percebeu que o chamado "botão neutro" o incomodava, pois atrapalhava sua execução. Resolveu colocar uma nota a mais: antes, sol/sol; agora, sol/lá, e a sequência ficou mais agradável". Nas palavras de Antônio, é "uma besteirinha que fez toda a diferença para ele". Curiosamente, portanto, a sanfona utilizada por Correia seria ajustada à afinação diatônica sem acidentes, utilizada em alguns países como Itália e França.No entanto, é uma afinação rara entre os sanfoneiros brasileiros e  Correia , provavelmente, é o primeiro que conheço a adotar esta modificação. 
Em 2006, por estímulo da família, voltou às atividades profissionais com a música.
Em 2007, é gravado o disco de estréia chamado "esse sim, faz forró"ao lado do filho Antônio ao contrabaixo e os percussionistas Cicinho, Ray e Mamá.
Neste meio tempo, Correia já gravou mais dois discos e como quase todo sanfoneiro que conheço, adquiriu outras sanfonas. Afinal, a variedade de timbres e tonalidades é um dos trunfos para aqueles que tocam um instrumento peculiar como o acordeom diatônico.Segundo Antônio, uma destas sanfonas possui " dois botões responsáveis por quatro acidentes agudos... ", ou seja, está na afinação diatônica com acidentes, tipicamente européia.
Enfim, Correia dos oito baixos é um exemplo de que é possível seguir a linha da tradição sem perder de vista a inovação e a singularidade. Em seu caso, sua idiossincrasia revela-se não apenas na técnica que desenvolveu, bem como na busca de outros tipos de afinação além daquelas que se consagraram entre os sanfoneiros do Nordeste.
Parabéns, Correia, pelos seus 59 anos de idade e pelos serviços prestados ao forró e à sanfona de oito baixos!
Leo Rugero

15 de fev. de 2012

Zé Cupido - Minha Terra (1970)



Zé Cupido é o nome artistico do sanfoneiro paulista José Ildemiro Cupido. Nascido em Taubaté, em 18 de dezembro de 1936, Zé Cupido é um dos raros representantes da sanfona de oito baixos na região Sudeste. 
Cego de nascença, ainda menino demonstrou dom musical na sanfona de oito baixos e na harmônica de boca. Começou a carreira tocando em quermesses e festas católicas. Em 1953 participa de programas na rádio Piratiniga e a partir de 1957 principia suas atividades como acompanhador e solista em gravações fonográficas. Sofreu influência do estilo ponteado dos tocadores de viola, instrumento preferido como solista na música caipira, que foi o berço primeiro da formação de Zé Cupido. Deste modo, as terças paralelas e o estilo ponteado estão fortemente presentes em seu trabalho. A influência da gaita-de-boca também se revela na maneira deste músico tocar o instrumento como se cantarolasse as melodias. 

A frente de seu regional, Zé Cupido acompanhou não apenas artistas paulistas reconhecidos como Capitão Furtado e Arlindo Pinto, bem como destaques da música nordestina como João do Pife.
Neste disco lançado pela Continental em 1976, Zé Cupido utiliza uma sanfona Hohner em afinação natural em dó/ fá com alterações. O repertório é constituido por canções famosas soladas por sanfona. A maior parte destas músicas possuem uma linha melódica apropriada ao canto, o que permite que o instrumentista possa valorizar notas longas e diferentes tipos de articulação das notas. Algumas músicas aparecem revestidas por ritmos diferentes dos quais foram originalmente destinadas. É o caso da toada "Luar do Sertão" que é interpretada em ritmo de samba brejeiro ou o xaxado "Mulher Rendeira" a meio passo entre o forró e o calango. 
O solista é acompanhado por um afinadíssimo regional de choro e os arranjos são simples e eficientes, valorizando a melodia das canções, demonstrando o singular estilo de Zé Cupido com sua sanfona de 8 baixos

Vale a pena a escuta!




12 de fev. de 2012

Dos 8 aos 120 baixos, de Januário a Luiz Gonzaga – Algumas impressões sobre a sanfona na região Nordeste Leo Rugero


Olá amigos,

segue abaixo a versão integral do artigo publicado parcialmente na revista da Unidos da Tijuca. As notas se encontram no final do texto.

Saudações sanfoneiras,

Leo Rugero




Dos 8 aos 120 baixos, de Januário a Luiz Gonzaga – Algumas impressões sobre a sanfona na região Nordeste            
Leo Rugero

No dia 23 de maio de 1829, construtor de órgãos austríaco Cyrill Demian registrava a patente de seu novo invento, um instrumento musical que seria batizado como “acordeom”. A novidade despertaria o interesse de outros construtores de instrumentos, suscitando o surgimento de novos modelos e formatos. Aos poucos, a invenção se espalharia por toda Europa e conseqüentemente para as respectivas colônias.
A partir da segunda metade do séc. XIX, o acordeom começa a ser amplamente difundido no Brasil, processo que se intensifica através da maciça migração italiana na região Sul. Em meio à leva de imigrantes, estavam instrumentistas e construtores de acordeom, que a essa altura, já havia se tornado uma verdadeira febre na Europa.
Entretanto, ainda não sabemos detalhadamente como o acordeom se espalhou no Nordeste brasileiro. Provavelmente, isso teria ocorrido ao longo do Séc.XIX, pelas mãos de mascates, tropeiros, caixeiros-viajantes. Na virada do Séc. XX, o instrumento começa a adquirir relevo nas práticas musicais desta região, com a rápida assimilação de um modelo específico de acordeom diatônico, que passou a ser regionalmente conhecido como fole de oito baixos ou sanfona de oito baixos. Para o musicólogo paraibano Baptista Siqueira, a sanfona teria gradualmente substituído a viola de arame[1] no contexto dos bailes rurais[2]. Como as sanfonas eram pequenas, leves, facilmente transportáveis, e ainda poderiam conservar a afinação por um período longo de tempo, o instrumento teria sido facilmente adaptado à vida nômade de tropeiros e cangaceiros ou mesmo entre vaqueiros e boiadeiros a serviço dos latifúndios, de forma análoga ao que teria ocorrido na região cisplatina[3]. Destes instrumentos poderia se extrair um som de forte intensidade, capaz de ser ouvido a distância, sendo ideal para os bailes “nas salas das choupanas, em danças animadas, nas vivendas dos pés de serra”[4].
Na região Nordeste, este tipo de acordeom recebeu uma afinação peculiar, um repertório específico e um estilo característico. Devido à presença intrínseca em festividades, difundiu-se entre as populações da zona rural e de periferia urbana, constituindo o imprescindível papel do ”sanfoneiro” em atividades sociais como casamentos, batizados, festas do ciclo junino, sobretudo no contexto de instrumento animador dos bailes (forrós). O repertório tradicional foi sendo construído através da apropriação e adaptação de danças européias que haviam sido aclimatadas aos sertões, tais como valsa, scottish(xote),  polca e quadrilha. Também seriam incorporadas danças de provável origem autóctone como o baião e o xaxado que, mais tarde, viriam a ser adaptadas por Luiz Gonzaga ao contexto fonográfico de sua época. A consolidação de um mercado fonográfico para a produção de música de origem nordestina se solidificaria com a consagração de Luiz Gonzaga no Rio de Janeiro nas décadas de 1940 e 50[5], possibilitando que o estilo nordestino da sanfona obtivesse reconhecimento e conquistasse um segmento significativo no mercado fonográfico destinado a música nordestina.
A venturosa carreira fonográfica de Gonzaga se inicia no dia 14 de março de 1941, quando realiza suas primeiras gravações como solista de acordeom nos estúdios da RCA-Victor, no Rio de Janeiro. A primeira música que gravou foi  “Vira e Mexe”, um solo instrumental que despertaria o interesse de público e crítica, não apenas devido a brejeirice e vivacidade do intérprete. bem como ao domínio técnico e o estilo inovador trazido pelo solista.
O que havia de tão diferenciado no estilo de Luiz Gonzaga? Para responder a isso é necessário regressarmos ao passado, em direção à Serra do Araripe, mais precisamente na Fazenda Caiçara, terras outrora pertencentes ao coronel Gauder Maximiliano Alencar de Araripe, o Barão de Exu[6]. Foi bem ali, pleno sertão de Pernambuco, que em 13 de dezembro de 1912, dia de São Luiz Gonzaga, viria ao mundo o primogênito do casal Januário José dos Santos e Ana Batista de Jesus. Ainda pequeno, o menino Luiz Gonzaga começaria a se interessar pelos sons extraídos da sanfona de oito baixos pelos dedos ágeis de seu pai, respeitado tocador e afinador de sanfonas da região. Logo, não demoraria muito para que o rebento seguisse os passos do pai Januário. Em 1920, por intermédio do Coronel Manuel Aires de Alencar, o menino Gonzaga adquire seu primeiro instrumento, uma sanfona de oito baixos Koch, marca Veado[7]. Vieram então os primeiros bailes e o filho de Januário foi adquirindo prestígio e despertando admiração entre os arredores da Serra do Araripe.
 Assim, Luiz Gonzaga foi crescendo, com seu forte temperamento artístico moldado pela tradição músico - poética dos sertões: os aboios dos vaqueiros, os desafios dos cantadores, as ladainhas das cantadeiras, a música das bandas de pífanos e sobretudo, o som da sanfona de oito baixos do velho Januário, tal como um crisol, refletindo todas as influências circundantes. E foi esta bagagem que Luiz Gonzaga levou consigo em seu “matulão”, desde quando arribou o pé de casa, ainda com “dezoito anos incompletos”[8]. Algum tempo depois, na década de 1930, Luiz Gonzaga viria a conhecer  o acordeom de cento e vinte baixos com teclado de piano para a mão direita, modelo então muito em voga na região Sudeste. Prontamente adquire um exemplar do instrumento e através de um colega do Exército, o mineiro Domingos Ambrósio, aprende a tocá-lo.
Portanto, o estilo inconfundível delineado por Luiz Gonzaga se desenvolve a partir do equilíbrio entre a prática musical da sanfona de oito baixos da região Nordeste e a incorporação do acordeom de cento e vinte baixos, tão presente nos centros urbanos da região Sudeste, mas ainda desconhecido no sertão nordestino. A partir de 1949, a definitiva consagração de Luiz Gonzaga com “O baião” tornaria o acordeom de teclado e cento e vinte baixos, um instrumento muito difundido no sertão nordestino.
Com o xote[9] “Respeita Januário” de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, a prática nordestina da sanfona recebe aquela que parece ser sua mais convincente perspectiva histórica. Esta música descreve uma visita de Luiz Gonzaga ao seu berço natal, o município de Exu, no alto sertão pernambucano, depois de sua consagração profissional no Sudeste, onde já havia recebido o título honorífico de “Rei do Baião”[10]. Luiz Gonzaga trazia em sua bagagem, um moderno acordeom de teclado e cento e vinte baixos, que, aquela altura, nas regiões interioranas, ainda consistia em uma “novidade”. Do mesmo modo, trazia a influência midiática de cantor, compositor e acordeonista de sucesso fonográfico e radiofônico. Porém, a certo momento da narrativa, surge um personagem, o vaqueiro conhecido como “Velho Jacó”, que adverte o rei do baião, dizendo: “Luiz, respeite os oito baixos do seu pai”.

Quando eu cheguei lá no sertão, eu quis mangar de Januário com meu fole prateado. Só de baixo cento e vinte, botão preto miudinho feito nego impariado. Mas, antes de fazer bonito, de passagem por Granito, foram logo me dizendo: de Itaboca à Rancharia, de Salgueiro à Bodocó, Januário é o maior! E foi aí que me falou meio zangado o “veio” Jacó: - Luiz, respeito os oito baixos, Luiz, respeito os oito baixos, Luiz, tu pode ser mais famoso, mas seu pai é mais tinhoso e com ele ninguém vai, Luiz. Luiz, respeite os oito baixos do seu pai!

Sendo o fole de oito baixos um instrumento que antecede historicamente o acordeom de cento e vinte baixos em quase um século, as construções simbólicas em torno das representações destes dois instrumentos na cultura nordestina foram edificadas ao redor  das relações entre pai e filho, moderno e tradicional, urbano e agrário, a migração nordestina para os grandes centros urbanos e a permanência do homem no campo.
Sob o impacto alvissareiro de “Respeita Januário”, um número  significativo de instrumentistas representativos da música instrumental praticada no fole de oito baixos nos bailes rurais, iniciam carreira fonográficas relativamente estáveis, a partir das gravações pioneiras do alagoano Gerson Filho, no Rio de Janeiro, em 1953. A produção de discos fonográficos torna-se, portanto, o eixo principal desta prática no contexto profissional, constituindo um verdadeiro “cordel sonoro” que acarretaria mudanças significativas nesta tradição musical permeada por uma permanente e incessante interlocução entre seus praticantes.
Passado mais de meio século, a sanfona de oito baixos e o acordeom de cento e vinte baixos continuam sendo os dois instrumentos solistas fundamentais na música nordestina destinada aos bailes, ou, melhor dizendo, “forrós”. O repertório tradicional continua sendo transmitido oralmente, de pai para filho e os inumeráveis êxitos fonográficos de Luiz Gonzaga continuam a vigorar, se intensificando sobretudo no período junino. Como dizia Luiz Gonzaga, “o fole de oito baixos é o pai do acordeom de cento e vinte baixos”. Portanto, o fole de oito baixos que era tocado por Januário “na beira do riacho[11]” e a sanfona de cento e vinte baixos, introduzida na música nordestina pelo filho Luiz Gonzaga, representam o conflito entre duas gerações nas práticas musicais que envolvem os bailes populares nordestinos, a tradição inventada e reinventada no fio do tempo.


Verbetes:

A sanfona de oito baixos é um tipo de acordeom diatônico, originado do modelo suíço, desenvolvido pelos construtores vienenses Drollinger e Hermann em 1836. Este instrumento é composto por uma, duas ou três fileiras de botões dispostos diagonalmente para a mão direita, e oito botões (notas graves - baixos e acordes de acompanhamento) para a mão esquerda. A principal característica dos acordeões diatônicos é a “bi-sonoridade”, ou seja, de acordo com a abertura ou fechamento do fole, cada botão ou tecla produz sons diferentes. Deste modo, o movimento do fole está diretamente relacionado à execução das melodias. Na região Nordeste é conhecido como fole de oito baixos, harmônica ou pé-de-bode, entre outras denominações. Muitos sanfoneiros de oito baixos adquiriram prestígio e reconhecimento, tais como Gerson Filho, Pedro Sertanejo, Zé Calixto, Abdias, Geraldo Correia, Arlindo dos 8 baixos, Luizinho Calixto e Heleno dos 8 baixos.

O acordeom de cento e vinte baixos pertence ao ramo dos acordeões cromáticos, que, ao contrario dos acordeões diatônicos, produzem a mesma nota para cada botão ou tecla, tanto no sentido de abertura quanto de fechamento do fole. O modelo mais difundido deste instrumento se caracteriza pelo teclado para a mão direita. Começou a ser amplamente divulgado a partir do inicio do século XX, sobretudo nos Estados Unidos, com o êxito fonográfico dos irmãos ítalo-americanos Guido e Pietro Deiro. No Brasil, o instrumento tornou-se uma verdadeira febre nas décadas de 1940 e 50, tendo sido amplamente divulgado por acordeonistas como Antenógenes Silva, Mario Mascarenhas e Alencar Terra. A facilidade digital proporcionada pelo teclado da mão direita e as possibilidades harmônicas dos baixos e acordes da mão esquerda, fizeram com que este instrumento fosse adotado por parte majoritária dos sanfoneiros profissionais. No nordeste, onde o instrumento é mais conhecido simplesmente como sanfona, tem surgido uma quantidade expressiva de representantes significativos, tais como Dominguinhos, Sivuca, Oswaldinho do Acordeom e Camarão.

Trio Nordestino - Luiz Gonzaga desenvolveu de forma alquímica, uma combinação sonora peculiar, que, devido ao êxito comercial do baião, se disseminou e popularizou, tornando – se uma formação “tradicional”. Segundo o depoimento de sanfoneiros como Dominguinhos e Zé Calixto, foi através de Luiz Gonzaga, que a formação de “trio nordestino” se propagou, e com a circulação massiva do repertório do baião, tornou-se preponderante em relação a outros conjuntos instrumentais. Basicamente, o trio nordestino é constituído de sanfona, triângulo e zabumba. De acordo com Zé Calixto, “o triângulo veio a ser mais explorado, depois que surgiu o baião. Pois o baião se identificou com o zabumba e o triângulo”. O próprio Luiz Gonzaga costumava assumir a invenção do “trio nordestino”, explicando como havia chegado a esta instrumentação.
Eu vinha cantando sozinho, mas eu precisava de um ritmo, porque a música nordestina precisava de ‘couro’ - couro que eu digo é couro de cachorro ou de bode, negócio pra bater, que aqui no Rio de Janeiro se usa couro de gato. Então primeiramente eu usei o zabumba baseado nas bandas de couro lá do sertão que a gente chama de ‘esquenta muié’. Mas, a zabumba só, eu fiquei assim com “asa quebrada”, até descobrir um instrumento bastante vibrante, agudo, pra brigar com a zabumba. Até que vi, no Recife, passar um menino vendendo cavaco chinês[i] (...) tocando o “tinguilim”. Aí, ele fazia aquilo com uma certa cadência. Aí eu disse: - Pronto! Achei o marido da zabumba.

Desde então, o trio nordestino se tornou a formação principal dos conjuntos de forró: sanfona, zabumba e triângulo.

Zabumba. Tambor circular, constituído de duas membranas, uma superior, tocada com baqueta felpuda, conhecida como “marreta”, e outra, inferior, tocado por baqueta fina conhecida como “bacalhau”. Deste modo, possui a conjugação timbrística do acento grave (superior/marreta) e da resposta aguda (inferior/bacalhau).

Triângulo. Instrumento idiofone, pequena armação triangular de alumínio tangida com um pequeno bastão. Antigamente, eram feitos com ferragem, daí o nome de “ferrinhos” em Portugal. Antes de Luiz Gonzaga, este instrumento era conhecido pelo nome de Tinguilim.









[1] Viola de arame: Um dos nomes atribuídos à viola, cordofone de cinco pares de cordas dedilhadas, muito difundido durante o período de colonização do Brasil.
[2] Siqueira, Batista. A origem do termo samba. Rio de Janeiro, Ibrasa, 1977.
[3] Lessa, Barbosa & Cortes, Paixão. Danças e Andanças  da tradição gaúcha. Porto Alegre, Editora Garatuja, 1975.
[4] Siqueira, Batista. op.cit.
[5] Araújo, Samuel. “Brazil: Forró, music for maids and taxi drivers e Asa Branca: Accordion Forró from Brazil”. Revista de Música Latinoamericana. v. 12, n.1, p. 97 – 99, 1991.
[6] Segundo a história oral, o nome da localidade se deve à presença dos Índios Ansú, antigos habitantes da região.
[7] A Koch Company foi uma fábrica alemã que produziu entre 1903 e 1929, quando veio a ser absorvida pela Hohner. Provavelmente estes instrumentos eram importados pela Marca Veado, conhecida fábrica de cigarros da época.
[8] Referência ao texto narrado por Gonzaga em “Respeita Januário” (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira).  A gravação original de “Respeita Januário” data de 13 de abril de 1950, pela gravadora RCA Victor, Rio de Janeiro.
[9] Corruptela de scottish, dança de origem européia.
[10] A gravação original de “Respeita Januário” data de 13 de abril de 1950, pela gravadora RCA Victor, Rio de Janeiro.
[11] Referência ao refrão do xote “Januário vai tocar”, de autoria do próprio Januário: “Ai, ai, sanfona de oito baixos do tempo que eu tocava na beira do riacho, ai, ai, sanfona de oito baixos, a cidade te acha ruim mas eu não acho”.








10 de fev. de 2012

Tico dos 8 Baixos - No forró Cabana Show

Enviado por eversantana123 em 09/02/2012 Video gravado por Everaldo Santana na Churrascaria Cabana Show. Tico dos 8 Baixos é um dos sanfoneiros que divulga a cultura da Sanfona de 8 Baixos em São Paulo.

8 de fev. de 2012


OS 8 BAIXOS DE ARLINDO

— 7 de fevereiro de 2012 por maristela

Próximo sábado, às 17h, é a hora e a vez de Arlindo dos 8 Baixos fazer o show no palco do Santander Cultural Recife. Nascido na Mata Sul de Pernambuco, Arlindo é um dos mais respeitados nomes da sanfona do país. Começou a mexer com um oito baixos aos dez anos. Pegou gosto pela coisa e nunca mais parou. Arlindo passou vários anos tocando sanfona de 80, 120 baixos, até que Luiz Gonzaga o aconselhou a voltar para os oito baixos, naquela época, final dos anos 60, um instrumento tocado por uma minoria de sanfoneiros. Com Luiz Gonzaga, ele tocou durante dezoito anos, enquanto construía sua própria carreira. Arlindo tem lançado CDs com freqüência, mas sua discografia em vinil está toda fora de catálogo, a espera de relançamento. No mais, o preço baixo de sempre, R$ 5,00 a inteira e R$ 2,50 a meia entrada.

6 de fev. de 2012

Luiz Gonzaga, o Rei do Sertão - samba-enredo da Unidos da Tijuca 2012

Sábado passado, dia 04 de fevereiro, ocorreu o famoso "Bacalhau do Pavão", evento promovido anualmente pelo Grêmio Recreativo Escola de Samba Unidos da Tijuca. Na edição deste ano, ocorrida no salão de eventos do Hotel Windsor da Barra, foi lançada a edição anual da revista "Tijuca", editada pela Escola. Dirigida por Bruno Tenório, a edição deste ano foi dedicada a Luiz Gonzaga, tema do samba-enredo da Unidos da Tijuca em 2012, em comemoração ao centenário do rei do baião. 
Esta revista é distribuida gratuitamente em diversos locais da cidade do Rio de Janeiro. Nesta edição, tive a oportunidade de colaborar com um artigo sobre a influência da sanfona de oito baixos e do acordeom de cento e vinte baixos na música nordestina. Os dois instrumentos são representados de forma simbólica por Januário e Luiz Gonzaga, pai e filho, dos 8 aos 120 baixos.
Abaixo, segue a capa da revista e o artigo, além de algumas fotos do evento.
Para baixar este artigo, clique aqui
Para acessar este texto na íntegra, clique aqui








                               
                                                       Bruno Tenório e Leo Rugero

Januário e suas sanfonas de oito baixos (parte I) - por Leo Rugero

Muito se tem especulado a respeito das sanfonas de Januário, porém pouco se sabe sobre o destino destes instrumentos. No entanto, algumas destas sanfonas foram presenteadas por Januário a seus filhos, que, por sua vez, passaram-nas adiante. Ao menos três histórias de sanfonas de Januário foram registradas durante minha pesquisa de campo e permitem-nos constatar a legitimidade destes exemplares que foram adquiridos, adaptados e afinados  pelo velho Januário.

Hering Beija-Flor 1928.  Alfred Hering foi um migrante alemão radicado em Blumenau, onde não apenas fixou-se com sua família, como fundou uma importante fábrica de instrumentos musicais, a Hering. A influência desta empresa no mercado de sanfonas de oito baixos foi superada apenas pela Todeschini em termos de popularidade e qualidade de seus instrumentos.
De acordo com Zé Gonzaga, Januário teria adquirido esta sanfona em 1928 (ver foto). Atualmente, o instrumento está em posse de Joquinha Gonzaga, filho de Muniz, sobrinho de Gonzaga e Neto de Januário. O instrumento foi transportado, isto é, adaptado ao sistema nordestino por Januário e ainda está valendo o quanto pesa. Prova disso é a gravação de Joquinha da música "No Ronco dos oito baixos".

Honer, c.1920 (?). Atualmente este instrumento faz parte do espólio de José Nobre, diretor e curador do Museu Fonográfico Luiz Gonzaga, localizado em Campina Grande. No Museu, há um texto explicativo sobre a história deste instrumento, que abaixo transcrevo.

“Esta harmônica, conhecido fole pé-de-bode, pertenceu a Januário José dos Santos, lavrador, sanfoneiro, consertador de fole, pai de Luiz Gonzaga. O Rei do Baião presenteou este fole a Arlindo dos 8 baixos, um dos melhores afinadores de sanfona da região Nordeste, no Recife, a quem o cantador do sertão confiava seus instrumentos. Assim Luiz Gonzaga expressou-se a Arlindo dos 8 baixos: - Estou lhe dando esta harmônica, que antes de ser minha foi do meu pai Januário. Na minha adolescência eu tocava com ela, ajudando o velho”.  



Hering/Honer. Este instrumento foi presenteado por Januário à sua filha, Francisca. É uma sanfona de 8 baixos modelo acordeom da Hering.  Provavelmente, o letreiro da Hohner foi colocado em substituição ao letreiro original. Existe, inclusive, uma foto jornalística de meados da década de 1950, em que aparece Januário passando esta sanfona para Chiquinha. De cor avermelhada, essa oito baixos acompanhou Francisca no decorrer de sua carreira e aparece em capa de discos e performances da cantora em que ela se acompanhava com o instrumento. Falecida em 2011, provavelmente a sanfona ficou aos cuidados dos herdeiros de Chiquinha Gonzaga.



Portanto, podemos concluir que estes exemplares foram de fato afinados e customizados por Januário, tendo sido empunhados por seus herdeiros. Com certeza, Januário teve outros instrumentos, cuja história ainda está em vias de ser contada. Quem souber algo sobre sanfonas que tenham pertencido ao velho Januário, por favor, entre em contato conosco, para ajudar-nos a escrever detalhadamente as histórias das sanfonas de Januário.

1 de fev. de 2012

Sanfoneiros do Ceará


CONTINUAÇÃO

No reino da sanfona

26.05.2003
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FRANCISCO SOUSA
CHICO PAES ainda agüenta tocar a noite toda, até de manhã. Às vezes, fazia três festas, “encarcadas” uma na outra e um pouco de cerveja ajudava a varar a noite
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ANTONIO BOA HORA “Só não toquei em dois lugares: no céu e no inferno”.
Chico Paes lamenta a invasão das bandas, que tem reduzido seu espaço, mas acredita na volta da tradição. Ele cobra em função da amizade, do lugar e das dimensões da festa, e de quem lhe contrata e “ajusta”, de trezentos a quinhentos reais por uma apresentação. Um amigo, no distrito de Flamengo, em Saboeiro, sempre manda buscá-lo, “porque acha que música velha é que é boa”.

Enumera suas preferências, “em primeiro lugar, Dominguinhos; em segundo, o que era sempre o primeiro, Luiz Gonzaga; Waldonys é terceiro lugar; e Chico Justino é um grande sanfoneiro”.

Às vezes, improvisa na hora da festa. “Outras vezes, me vêm as notas, e eu aproveito a noite, ou acordo bem cedinho, até fazer a música, sempre de cabeça”.

Recebe encomenda de gravação de fitas cassete, e atende às pessoas amigas: “não entrego minhas músicas para qualquer um, eles registram dizendo que é deles”.

Todos os cinco irmãos já tocaram, e o sobrinho, Antonio também resfolega no fole. O mais novo o acompanhava no pandeiro e cantava, adotou a “sanfona grande”, e se revezavam nas festas, até o caçula entrar para a polícia.

Seu “pé-de-bode” italiano, foi comprado em São Paulo, e diz que é “difícil um sanfoneiro dar conta das duas”, com o mesmo virtuoso.

Ainda agüenta tocar a noite toda, até de manhã. Às vezes, fazia três festas, “encarcadas” uma na outra, e um pouco de cerveja ajudava a varar a noite.

Tem recebido promessas de gravação, rapidamente esquecidas, mas gostaria de deixar “uma lembrança“, como ele diz.

ANTONIO BOA HORA

Nascido no Mucambo, pé da serra da Ibiapaba, em dezembro de 1927, Antonio é filho do tocador Manoel, “homem preguiçoso para trabalhar na roça” e de dona Arlinda.

Veio com a família para os Inhamuns, na seca de 1932, em lombo de jumento, trazidos pelo tio Cândido, que vendia rapadura da Ibiapaba no sertão. Foram para Nova Olinda, município de Independência, e depois se fixaram em Crateús.

Não sabe de onde veio o apelido Boa Hora, a família mesmo é Santiago.

O pai sempre “um sanfoneiro fraco, que tocava pouco e fazia zoada para o povo dançar”, mesmo assim era chamado para as festas, apesar de seu repertório acanhado, uma meia dúzia de forrós, se tanto.

O menino aprendeu a tocar “pegando a sanfona escondido, quando o pai não estava em casa” e, aos 12 anos, veio o convite para o primeiro forró. “Seu Manoel, ouvi falar que teu menino já toca...”. E veio a resposta: “faz um barulho aí”.

O pai achou que ele não daria conta, mas foi convencido pelo promotor da festa na fazenda Fidalgo, do finado Zacarias Martins, de que o menino, aos doze anos, já agüentava tocar a noite inteira, e ainda receberia 12 mil réis.

Voltou para casa com o dinheiro no bolso e, a partir daí, sua vida mudou. Pela segunda festa, na Graciosa, o ajustado foi vinte e cinco mil réis, e tomou a primeira cachaça de sua vida. Diz que a bebida atrapalha o tocador: “tem sanfoneiro que, devido ao álcool, não é chamado nem para tocar em dança de São Gonçalo”, ele remete a uma manifestação religiosa em que as pessoas rodopiam em louvor ao santo de Amarante.

Teve oito dias de escola, quando lhe ensinaram a “fazer” o nome. “Não aprendi, mas vontade tinha demais”. A experiência do professor Zé Rodrigues durou pouco: montou escola, reuniu os meninos das redondezas, mas desistiu quando soube que os caititus estavam comendo sua plantação de mandioca, na serra.

Dedicou-se à sanfona com afinco, e sua fama correu a região. Lembra de festas memoráveis, nas latadas cobertas de palha, onde vinha gente de longe ouvir o menino sanfoneiro, que não parou mais de tocar.

No repertório, Luiz Gonzaga, Noca do Acordeon, e, no matulão, uma arma “para se defender”. Aconteciam brigas nos forrós, ele diz que “tem muita gente reimosa no mundo”, mas todos respeitavam o sanfoneiro Boa Hora.

Casou, em 1955, com Gonçalina de Sousa, tiveram sete filhas mulheres, “trabalhei para os outros”, diz, machista, e um único filho, José Nilson, sanfoneiro em São Paulo, tendo gravado Cd, que atesta a continuidade de uma linhagem de tocadores.

Seu Antonio não se apresenta mais profissionalmente, mas não resiste à idéia de tocar para os amigos, abre o fole de sua Scandale, de 120 baixos, e dá um “show”, com Tiago na zabumba, e Robson no triângulo.

A primeira sanfona, uma Todeschini, foi comprada mesmo em Crateús, no armazém de Manoel Sales. Ao todo, foram mais de dez, pois como tocava muito, estragava logo o fole.

Muita gente andou “dezessete légua e meia” para ouvi-lo relembrar os tempos de tocador requisitado, a fama sertão adentro, e a certeza de uma vida bem vivida. “Só não toquei em dois lugares: no céu e no inferno”.

NELSON ARAÚJO

Nascido no Castro, sertão de Quixeramobim, em 1932, Nelson é de uma família de tocadores e, aos doze anos, foi mandado pelo pai para estudar em Água Verde, Guaiúba. Três meses depois, o meninote não suportou as saudades, e voltou para casa.

O pai, Irineu Castelo Branco de Araújo, cultivava a terra dos outros, e também tocava uma oito baixos, que ele não sabe que fim levou. A mãe, Maria das Dores, teve dezessete filhos, dos quais quinze se criaram, sendo 7 homens e 8 mulheres. Ou seria o contrário? Ele não tem certeza, e ri.

Trabalhou muito tempo na roça, até passar a tocar nos forrós com o irmão mais velho, Mário, em cuja sanfona se iniciou, “pegava, experimentava, e fui aprendendo”, e com quem passou a se revezar nas festas. Diz que o irmão, morto em 1980, era “sanfoneiro de verdade”.

Tocou muito, compôs alguns forrós, tendo inclusive alguns gravados, pelos parceiros Clementino Moura e Chico Justino, mas nunca se dedicou, com garra, a esta arte.

No repertório, “Asa Branca”, “Assum Preto”, os baiões de Luiz Gonzaga, além de Noca do Acordeon, e Jackson do Pandeiro.

Alternava o trabalho na roça com a música. Ia para as festas a cavalo, na companhia do irmão, com as sanfonas a tiracolo. Apresentavam-se em Capistrano, Boa Viagem, Pedra Branca, onde fossem convidados.

Casou em 1957, mas não conheceu dona Zeneida no forró. Tiveram doze filhos, dos quais dez se criaram, nenhum sanfoneiro.

Terminou vindo morar em Fortaleza, em 1974, na Granja Portugal, e depois construiu a casa em Maracanaú, onde vive.

Já maduro, veio a possuir uma sanfona cromática, com botões, ao invés do teclado, que dá melhores condições de interpretação, graças à ajuda do sobrinho Irineu, afinador deste instrumento.

No capítulo das relembranças, as latadas de palha, o forró “solado”, a lamparina, a quadra de chão batido a malho, e o “samba”, como se chamavam as festas de então, com poucas brigas, segundo ele.

Uma vez foi tocar no rádio, mas “faltaram os nervos”, e não tocou direito.

Parece viver em paz, com suas lembranças das festas “nos matos”, do forró a noite inteira, quando a sanfona, ganhou o auxílio da zabumba, depois do triângulo, e por fim vieram o pandeiro, e o banjo ou cavaquinho, dependendo da região.

Bebia um pouquinho porque “se beber demais, faz é ficar mais ruim”. De vez em quando “peleja por aqui” ou seja, compõe alguma coisa.

Trabalhou como zelador para uma destas empresas que terceirizam mão - de- obra, até se aposentar, por problemas cardíacos graves, o que o impede de tocar com freqüência uma sanfona que pesa dez quilos, e lhe causa um certo “enfado”.

“Não sou muito chegado às novas bandas de forró, é outro tipo, uma orquestra danada”, diz de modo diplomático, e complementa que não saberia tocar o que chamam de novo eletrônico.

Nelson parece conviver bem, sem mágoas, com o fato de ter ficado nos bastidores, enquanto o irmão Mário, de quem sente muitas saudades, brilhava, e atendia aos insistentes pedidos de bis.
Gilmar de Carvalho - Especial para o Caderno 3