19 de mai. de 2009

Sobre dois recentes filmes


Recentemente, estrearam dois filmes, tendo a sanfona e sanfoneiros como foco principal. Não vi os dois filmes, portanto não falarei sobre eles, mas sim, sobre o modo como eles estão sendo trabalhados quanto as formas de divulgação.
Tanto em "Paraiba meu amor" do diretor franco-suiço Bernand Robert-Charrue, como em "O Milagre de Santa Luzia"do brasileiro Sergio Roizemblit, o fio condutor é semelhante. Um destacável insider que conduz as câmeras dos diretores através das paisagens, revelando ao público alguns tesouros. Em "Paraiba, meu amor", o insider é Chico Cesar, compositor paraibano. Em "O milagre de Santa Luzia", é Dominguinhos. Se o primeiro filme trata do forró tradicional, e de atores sociais representantes desta modalidade, no segundo o foco é mais amplo: simplesmente, o acordeom no Brasil (!).
Antes que eu veja os filmes, e verei o quanto antes, e desejo que todos vejam, o que eu quero sublinhar são alguns "cacoetes" do mercado, que desprezam solenemente a pesquisa musical, em prol de generalizações, e amplos paineis que tentam dar conta de uma diversidade talvez impalpável.
Em "Paraíba, meu amor", o cartaz promocional do filme exibe a seguinte frase: "Um filme sobre o forró, a musica do nordeste brasileiro". Destaco o artigo "a", por definir o sujeito em torno de uma modalidade. Assim, a vasta experiência sonora nordestina, que compreende fenômenos como a banda cabaçal, a cantoria, as excelências, os maracatus e porque não a mangue beat e a musica armorial, fica circunscrita a uma faixa estreita, tida como "a" legitima representação, e não "uma" legitima representação. Este modelo de generalização , é mais comum que imaginamos, e deu-se ainda na primeira metade do século XX em torno do samba, eleito como a"musica nacional", por excelência. O mais dramático no filme de Robert-Carrue, é o fato de ser dirigido ao mercado europeu, onde o "canibalismo cultural"(utilizando a expressão do antropólogo José Jorge de Carvalho), tende a remodelar a imagem de uma música "étnica" quando esta ingressa no mercado multinacional da "world music".
Em "O milagre de Santa Luzia", o amplo painel do acordeom no Brasil, objetiva um campo extremamente "macrocósmico", onde muitas omissões podem ser cometidas, mesmo entre os nomes mais relevantes. Assim, a sanfona de 8 baixos nordestina representada por Arlindo dos 8 baixos, mas aonde estão Luizinho Calixto, Heleno dos 8 baixos, Geraldo Corrêa ou Zé Calixto?
O perigo da generalização é tentar confinar em 100 minutos, uma história ampla. Fechar o foco, buscar o "microcosmico" no campo de pesquisa, delimitar o campo ao minimo necessário pode ser algo tácito, e estimulante. Pois normalmente, as historias das artes em geral, ainda são contadas por nomes de autores e suas obras.
Para concluir este comentário, deixo com a palavra o etnomusicologo Bruno Nettl, sobre as dificuldades do campo de pesquisa macrocósmico: "Devido a necessidade de uma organização engenhosa e um controle de infinidade de dados, poucos investigadores tem tratado com algum êxito de realizar a aproximação compreensiva 'macro'".

Referências:

Nettl, Bruno. Reflexiones sobre el siglo XX. Revista Transcultural de música n.7, 2003.

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